| segunda-feira, 23 de abril de 2018 | 0 comentários |
Que horas são? Toco o celular, ele acende, são 19:25, a bateria já quase se foi. Desligo logo a tela pra economizar energia. Tão cedo, e tão escuro, todos tão deitados, gosto muito da minha avó, mas essa parte de dormir aqui com ela... Essa casa me dá medo.
Casa do interior, com imagens de santo dependuradas com fitas e flores, nas paredes. Fotos do tempo que ainda se pintavam as fotos. Tudo a essa hora tem um ar sinistro. Mesmo ligando a luz, que ainda é das incandescentes, a luz amarelenta e pastosa que cobre tudo deixa ainda menos confortante o cenário.
O cenário do tempo.
O tempo que engole os rebocos na parede do altar dos santinhos, com a vela-de-sete-dias e seu fogo tão ínfimo e agora tão colossal no betume. Sinto sufocamento na gaiola do mosquiteiro, e minha bexiga para estourar me obrigam a rastejar até o banheiro, oh céus... Nessa hora invejo o penico de vó. Dou um risinho curto que acaba assim que saio do mosquiteiro e boto os pés no chão, de pé, de frente ao vão do quarto, escuro como a falta de esperanças, tento não temer mas é tarde demais, seguro o celular com força, maldição como pude esquecer o carregador? Acender a tela agora e ter um flash dos móveis aparentemente mortos me deixaria ainda mais assustado... Imagina se enxergasse alguma visagem?

Dou um gole a seco e lembro de ter lido o termo na noite anterior, nalgum conto de Poe ou Lovecraft, era sobre uma coisa no escuro... Melhor não lembrar dos detalhes. Não há de ser imbecil, o que posso temer na realidade é algum ladrão ou bicho peçonhento...
Um barulho estranho interrompe os pensamentos.

Alguém querendo invadir essas casas isoladas de sítio? Um rato? Um bicho medonho?
Sente uma pontada na bexiga - não tem como voltar pra cama sem mijar.
Anda com pés de pluma e ouvidos de interfone, ouve ainda bem distante e pouco nítido, será nas telhas?,
 um pássaro noturno trazendo mau agouro? um galho de árvore? uma alma-coisa-feia?
Entra no banheiro abraçado com a porta, sem ousar acender a luz, tem um susto quando o primeiro jato acerta a água, mas aguenta firme a ansiedade do barulho fazendo ecos na casa toda.
Termina e a volta é tão rápida que nem percebe. Finalmente enrolado no lençol liga a tela novamente, são 19:42.
Nem o medo que sentiu a noite toda dos barulhos do sítio em noites de inverno, nem o sono mal dormido e mal acordado, nada o prepararia para encontrar sua vó morta pela manhã.

Não eram anfíbios nem aves noturnas nem vento nos galhos nem criminosos ou monstros sobrenaturais.
Era a matriarca gemendo a vida embora, a noite toda.


| quarta-feira, 4 de abril de 2018 | 1 comentários |
Levanto da cova.
Olho em volta.
Onde estará o terror, em pleno 2018?